|
por J.Bosco para O Liberal cedido ao Humor Político
|
A maioria da população
de Belém, não sem razão, considera a saúde pública o problema mais grave da
cidade. Com tantas mortes nas filas dos pronto-socorros e denúncias diárias de
falta de médicos, de remédios e de equipamentos nas unidades de saúde, há uma
enorme expectativa de que o atual prefeito consiga solucionar o caos no setor
deixado por Duciomar Costa, sobretudo após a campanha eleitoral de Zenaldo
enfatizar repetidas vezes que a saúde seria a prioridade absoluta de seu
governo.
É bem verdade que a
saúde pública em nosso município encontra-se de fato em “estado de emergência”,
contudo não é através da mera dispensa de licitações por 30 dias para
contratação de serviços e compra de materiais que serão eliminadas as causas
responsáveis pela calamidade da saúde pública.
O grande problema da
saúde em nossa cidade, e que se repete no Estado e no país guardadas as devidas
particularidades, é a hegemonia do setor privado na oferta deste direito
público que deveria ser dever do Estado promover, conforme está
assegurado na Constituição Federal em seu artigo 196.
De um total de 1685 estabelecimentos de saúde
cadastrados no DATASUS no município de Belém, 1542 (mais de 90%) são privados.
A privatização se expressa também na quantidade de leitos. Dos 3209 leitos
existentes clínicos e cirúrgicos existentes em Belém, apenas 1569 (menos de
50%) são leitos do SUS.
Essa prevalência do setor privado na
oferta do atendimento é fruto de um intenso processo de consolidação de uma
concepção neoliberal de Estado que trata saúde como mercadoria e os
investimentos sociais como gastos desnecessários. Em âmbito nacional, o Brasil
investe apenas 3,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em saúde pública e 4,4% e saúde
privada (consultas, convênios, medicação), sendo que a Organização Mundial de
Saúde (OMS) recomenda que sejam investidos no mínimo 6% do PIB em saúde pública
para que se universalize o acesso.
Esse problema do desfinanciamento do
setor público e da desregulamentação do setor privado obviamente atinge nosso
município também. A rede municipal de saúde administrada pela SESMA conta com
apenas 02
pronto-socorros, 29 Unidades Básicas de Saúde, 15 casas especializadas, 107
equipes do Programa Saúde da Família e 15 ambulâncias do SAMU para atender uma
demanda de uma capital com mais de 1,4 milhões de habitantes e mais de 2
milhões de pessoas se considerarmos a Região Metropolitana. Tudo isso com R$
529. 835.258,00 alocados para a saúde em 2012. Para este ano de 2013, estão
previstos no orçamento municipal um total de R$ 562.743.197,00 de um orçamento
de um pouco mais de R$ 2,4 bilhões.
Algumas conclusões podem ser extraídas desses dados para
a formulação de um programa que garanta a efetivação desse direito social: há
necessidade de mais investimentos federais, estaduais e municipais na saúde
pública; é preciso combater a privatização do setor, que drena recursos
públicos para os hospitais, clínicas, consultórios e laboratórios privados e
urge, ao mesmo tempo, democratizar a gestão para que se tenha de fato controle
social dos usuários e trabalhadores e se possa efetivamente combater a
corrupção e a má gestão orçamentária.
O Ministério Público, juntamente com os órgãos de
controle e auditoria das contas públicas, tem o desafio de cobrar da SESMA e da
Prefeitura o volume e o detalhamento dos recursos repassados das verbas do SUS
para o setor privado e os movimentos sociais precisam recuperar a pauta de luta
por mais verbas para a saúde pública, contra a privatização do setor e pela
democratização da gestão.
A rede pública de saúde tem que ser dirigida e controlada
por quem de fato entende seus problemas, suas virtudes e necessidades: os
usuários e trabalhadores. Só assim haverá concurso público para contratação de
profissionais, valorização da carreira e a efetivação dos princípios do SUS
(universalidade, integralidade, equidade). O prefeito também precisa entender
que investir em saneamento básico e segurança alimentar também é investir em
saúde, pois os benefícios à saúde da população que trazem o acesso à rede de
esgoto, coleta de lixo, água potável e a uma alimentação balanceada se revertem
em economia com a saúde pública e melhoria da qualidade de vida.
Não somos partidários da tese do “quanto pior, melhor”,
porém queremos alertar para a profunda limitação que representa o ato de
decretar o estado de emergência, pois a crise estrutural da saúde pública em
nosso município não irá se resolver apenas com medidas de efeito midiático ou
com troca de secretário. Só com medidas socialistas, que concebam a saúde como
direito social e dever do Estado e não como mercadoria, é que poderemos avançar
na resolução desse grave problema social. Saúde é vida e não pode ser tratada
como fonte de lucro. O programa tucano de “choque de gestão” nunca deu certo em
lugar nenhum. Um exemplo é o atual governo Jatene que mantém a sangria de
recursos públicos para organizações sociais e fundações de direito privado
administrarem os hospitais regionais. Apenas favoreceu os grandes planos de
saúde e empresários do setor privado e os ricos que podem pagar pelo acesso à
saúde de qualidade enquanto os trabalhadores padecem com o péssimo atendimento,
filas intermináveis e falta de médicos e remédios. O Ophir Loyola vive uma
crise crônica em relação às debilidades no atendimento aos pacientes vítimas de
câncer e o hospital metropolitano administrado pelo idesma vive atrasando o
salário dos funcionários, que causou inclusive demissão recente de vários
destes, deixando sem atendimento centenas de pacientes e justifica isso pela
falta de repasse dos recursos do estado.
É preciso inverter a lógica de gestão da saúde.
Fortalecer financeira e tecnicamente o SUS, combater a privatização, abrir
concursos públicos, valorizar os profissionais da saúde e democratizar a gestão
são os caminhos que podem realmente mudar essa triste realidade em que vivemos.
Fazemos um desafio ao prefeito Zenaldo Coutinho: abrir as contas da SESMA e tornar as transferências, contratos e convênios do SUS
com o setor privado informações públicas e transparentes e ao mesmo tempo
convocar os movimentos sociais em defesa da saúde (sindicatos, usuários, etc,)
para planejar, dirigir, acompanhar e controlar a gestão da saúde municipal. Com
a palavra, o prefeito de Belém.
Cleber Rabelo - PSTU
Vereador operário e socialista
Belém, 24 de janeiro de 2013