Charge: Luiz Pinto - Belém, 397 anos. |
As comemorações oficiais ao redor do aniversário de Belém ocultam a dura realidade de que o direito à cidade é algo para poucos – para os ricos. A desigualdade social e a luta de classes refletem na forma como as pessoas se relacionam com a cidade.
Para
um trabalhador de um bairro periférico, o atual inverno amazônico, por exemplo,
é motivo pra muita dor de cabeça, pois a falta de saneamento básico que atinge
mais da metade dos moradores da cidade, incluindo a sua, resulta em transtornos
diários como enchentes, aumento na incidência de doenças como dengue e
leptospirose e engarrafamentos insuportáveis no já caótico trânsito de Belém.
Para
este trabalhador, provavelmente morador do Tapanã, da Terra Firme ou da Pratinha,
só pra ficar em 3 exemplos, não há grandes motivos para se comemorar o
aniversário de Belém, pois no posto de saúde do seu bairro é difícil encontrar
medicamento e atendimento médico de qualidade. A escola de seu filho sofre com
o sucateamento da infra-estrutura física, com professores mal pagos e
desmotivados e com um currículo escolar que não consegue deter a escalada da
violência dentro e fora da escola porque é completamente alheio aos problemas
da sociedade. Para este trabalhador ou para o filho deste trabalhador, é
difícil se deslocar para as comemorações do aniversário de Belém, porque a
passagem é cara, os ônibus demoram a passar, estão sempre lotados, sujos,
calorentos, param de circular no melhor da festa, o trânsito é caótico e o
risco de ser assaltado no retorno para casa é altíssimo. E se chover então nem
se fala.
Para
uma mulher trabalhadora, que ganha um salário mínimo por mês, a vida em Belém
também é muita dura, pois 85% das crianças de 0-3 anos, incluindo seus filhos,
estão fora das creches públicas por falta de vagas e a inflação, de 8,31%, é a
mais alta das 11 capitais pesquisadas pelo DIEESE.. Para esta mulher, que sonha
em construir sua casa própria, a cidade lhe parece muita ingrata, pois ela
trabalha o dia inteiro, mas não consegue regularizar o terreno de sua casa ou
entrar em uma linha de financiamento porque o poder público ignora a
necessidade de realizar uma reforma urbana em Belém que tem um déficit
habitacional de mais de 73 mil unidades habitacionais e os programas de financiamento
só contemplam famílias com renda superior a 3 salários mínimos. Também pesa
sobre esta mulher trabalhadora as chagas físicas e psicológicas do machismo. Só
existe uma delegacia especializada no atendimento à mulher em uma das capitais
em que as mulheres mais sofrem com a violência de seus próprios “companheiros”.
Já
os grandes empresários e os governantes tem motivos de sobra para festejar. Os
empresários de ônibus tiveram reajuste da tarifa de ônibus em 2012 e podem ter
de novo esse ano se o BRT for concluído,
a Andrade Gutierrez está rindo a toa com a Macrodrenagem da Bacia da Estrada
Nova e com o BRT, diferentemente dos moradores remanejados do Jurunas que ainda
não tiveram suas novas casas entregues e dos rodoviários que perderão 1200 postos
de trabalho com esta obra de trânsito.
Quem também deve estar feliz com o aniversário de Belém é a atual
secretária de finanças do município que não paga o IPTU e ainda vai receber um
polpudo DAS no final do mês.
Belém
sempre foi governada pelos ricos e para os ricos – desde os tempos coloniais –
porém as grandes lutas sociais, desde a
revolução cabana, nos inspiram a seguir lutando por uma cidade para os
trabalhadores, único caminho para combater o abandono dos bairros periféricos,
a precarização dos serviços públicos, a corrupção e o privilégio das elites. O aniversário de Belém deve ser uma ocasião
para refletirmos sobre os problemas estruturais de nossa cidade e avançarmos em
nossa organização e mobilização coletivas pelo direito à cidade para os
trabalhadores, que são aqueles que constróem a cidade, mas que tem negado seu
acesso aos serviços básicos, à sua história e a suas belezas naturais e
culturais.
Cleber Rabelo, vereador de Belém
pelo PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado).
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